terça-feira, 6 de abril de 2010

SAÚDE - Falta de doadoras de leite materno repercute na recuperação de bebês prematuros

O reduzido número de doadoras de leite humano influencia diretamente no desenvolvimento dos bebês prematuros internados em Unidades de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN). Essa relação direta é confirmada pelo pediatra Paulo Menezes, que cuida dos recém-nascidos de baixo peso na Maternidade Nossa Senhora de Lourdes.

"O mais importante para esse tipo de paciente é que ele receba o leite humano o mais cedo possível. Com a falta de doadoras, a oferta de leite é menor e, consequentemente, temos que usar o leite artificial como alimento desses bebês, o que pode acarretar um prejuízo maior para o seu desenvolvimento", alerta o médico.

O leite materno é o alimento mais completo para a criança, já que tem na sua composição uma proteína que é de fácil digestão para o bebê, além das imunoglobulinas e vitaminas. "Se usarmos o leite artificial, podemos gerar danos para o aparelho digestivo, como uma infecção do trato gastrointestinal (enterocolites) e alergia alimentar, pela intolerância do recém nascido à proteína que não é adequada a ele", explica Menezes.

Para ele, a doação de leite humano por parte das mães é fundamental para garantir melhores resultados na recuperação dos prematuros. Havendo redução de doadoras, o abastecimento das Unidades de Terapia Intensiva Neonatal (UTINs) fica comprometido, como vem acontecendo nos últimos quatro meses.

Carência

Para se ter uma idéia da crise enfrentada pelas maternidades com a redução do número de doadoras, nos três primeiros meses deste ano, o Banco de Leite Humano (BLH) "Marly Sarney" - responsável pela captação, pasteurização e distribuição de leite para os recém-nascidos internados em UTINs – coletou apenas 105 litros do líquido precioso, quando o ideal seria uma média de 450 litros para atender Aracaju.

"Sabemos que o melhor alimento para qualquer bebê é leite humano, mais ainda para os que nascem com baixo peso, por isso chamamos a atenção das mães que têm leite em excesso para que façam a doação para o banco de leite", pede Hélia Karla Agapito, coordenadora do BLH, acrescentando que a instituição está disponível para as mães que se sentirem sensibilizadas com a situação.

Hélia Karla ressalta que todos os profissionais da área de saúde, principalmente obstetras e pediatras, devem sensibilizar as mães para o aleitamento tanto no pré-natal quanto no pós-parto. "É fundamental que toda a equipe das maternidades esteja atenta para captar essas mães doadoras e criar um vínculo com elas através do acolhimento. É uma parceria que traz benefícios tanto para a mãe quanto para os bebês".

Dificuldades


A trabalhadora rural Aclécia de Santana Santos, 18 anos, viveu o drama de não ter como alimentar a filha prematura com leite materno. Larissa nasceu com seis meses de gestação e 1,255g no dia 23 de fevereiro, em Itabaiana. Foi internada na UTIN da Nossa Senhora de Lourdes com dificuldade respiratória, mas Aclécia só ficou com a filha quando ela saiu da terapia intensiva, em 12 de março. Nesse meio tempo, ela não conseguiu produzir leite, apesar de ter sido orientada a fazer a estimulação através de massagens.

"Sempre vinha visitar minha filha e ficava preocupada porque ela tomava o leite artificial. Sempre tive esperança de produzir o leite para ela, porque sabia que seria o melhor para o desenvolvimento. Depois de tomar remédio para estimular, consegui tirar em pequenas quantidades. Hoje me sinto uma vitoriosa por ter insistido e pensar positivo, pois o resultado é que alimento minha filha e ainda sou uma doadora", conta aliviada.

O fator psicológico é um dos aspectos que mais influencia na produção do leite materno, sendo destacado pela psicóloga Andreia Reis Mendonça como um entrave para as mães. "Elas passam por toda uma carga emocional devido à própria mudança no corpo e na vida como um todo, por isso é importante não se sentirem pressionadas, para não causar uma ansiedade maior", explica.

A psicóloga, que trabalha diretamente no atendimento às mães internadas na Ala Verde da Maternidade Nossa Senhora de Lourdes, defende que a melhor coisa a fazer é deixar a mãe tranquila, bem orientada e alimentada. "Com o tempo, os estímulos e a sucção do bebê no seio materno, o organismo vai reagindo e produzindo o leite. Assim, teremos bons resultados", acredita Andreia Reis.

A paciência e a calma foram essenciais para que a funcionária pública Sheila Dias produzisse leite suficiente para o filho João Gabriel, que nasceu pesando um pouco mais de um quilo e ficou 57 dias internado na UTIN. Sheila conta que foi doadora por cerca de 40 dias, mas, quando o filho teve alta e foi encaminhado para o Método Canguru, passou por um período de baixa produção. "Acredito que tenha ficado nervosa com toda a situação e cheguei a produzir 20ml por ordenha, mas fui incentivada por toda a equipe, tomei uma medicação para estimular e quando ele foi para o peito sugar, consegui produzir leite novamente".

Para a psicóloga Andreia Reis, o que aconteceu com Sheila é muito comum, pois o estado emocional pode oscilar a cada momento. "É importante passar segurança para a mãe, incentivá-la para que repouse, tome bastante líquido e aceite as mudanças ocorridas com o corpo".

Ela acrescenta que o apoio da família também é fundamental, já que muitas vezes essa mãe pode se sentir deslocada em um ambiente estranho e distante dos outros filhos que deixou em casa e do marido. "Tudo pode influenciar, desde um aborrecimento até uma preocupação leve, como ter que produzir o leite a qualquer custo", esclarece.

Estatística

No primeiro trimestre, a maternidade Nossa Senhora de Lourdes registrou o nascimento de 282 bebês abaixo de 2,5kg, o que significa uma média de 30% do número de crianças nascidas na unidade. O pediatra Paulo Menezes explica que a primeira alimentação de um bebê prematuro é o soro e a nutrição parenteral (NPP), uma dieta rica em aminoácidos, proteínas, glicose e outros nutrientes.

"Depois vamos progredindo essa dieta e inserindo o leite humano. Quanto mais cedo fizermos isso, melhor para o ganho de peso e o fortalecimento do organismo. Por isso, torcemos para que as mães possam contribuir com a doação de leite para esses bebês. Isso seria uma ajuda valiosa para todos os que lutam pela sobrevida dessas crianças", ressalta o médico.

O banco de leite vem trabalhando com um estoque de leite abaixo do necessário, mesmo recebendo a ajuda dos bancos de Itabaiana e Lagarto. Este ano, a instituição que é referência no Estado, atendeu em parte o que foi solicitado pela Maternidade Nossa Senhora de Lourdes.

"O leite pasteurizado dos últimos meses foi destinado apenas aos prematuros extremos da unidade, que pesam entre 500 e 800 gramas, ou seja, precisávamos de 4 a 8 litros de leite e só tínhamos 1,5 a 2 litros, o que causou uma deficiência no abastecimento", lamenta a coordenadora do BLH "Marly Sarney", Hélia Karla Agapito.

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