terça-feira, 12 de agosto de 2008

Juiz mantém vereadores em São Cristóvão

O Juiz da Comarca de São Cristóvão, Manoel Costa Neto, acatou a liminar e manteve nos cargos os vereadores, Jadiel Campos e Luiz de Souza, que assinaram o pedido de renuncia de seus mandatos, quando da realização da eleição para assumir a vacância do cargo de prefeito daquele municipio, com a morte do prefeito afastado, José Correa neto, o Zezinho da Everest.

Na sessão que será realizada pela Câmara Muncipal de São Cristóvão, nesta terça-feira, os vereadores poderão decidir a nova data em que será escolhido o nome para ocupar de fato o cargo de prefeito daquele muncipio, até 31 de dezembro desse ano.

Veja o mandado de segurança impetrado pelos vereadores bem como a decisão judicial que os mantém no cargo:

Mandado de Segurança.

Impetrantes: Jadiel Campos e Luiz de Souza

Iimpetrado: Jorge Luiz Lisboa de Santana - Presidente da Câmara de Vereadores do Município de São Cristóvão

O homem só é feliz até o dia que precisa da Justiça. Como Autor, pior como Réu, pois dai ele perdeu a Paz.

Manoel Costa e Silva

Vistos et coetera.

JADIEL CAMPOS e LUIZ DE SOUZA, devidamente qualificados nos autos em epígrafe, vieram, perante este Juízo, por conduto de procurador, impetrar Mandado de Segurança com requerimento Liminar contra ato do Vereador JORGE LUIZ LISBOA DE SANTANA ? PRESIDENTE DA CÂMARA DE VEREADORES DO MUNICÍPIO DE SÃO CRISTÓVÃO, também qualificado, almejando, em sede de liminar a abstenção do ato que determine a convocação dos suplentes para assumir o cargo, cada qual, de Vereador Municipal no lugar dos impetrantes; ou, em assim já procedido, a revogação do ato, em virtude da existência de demanda em Juízo, para apreciação da validade da sessão extraordinária da Casa Legislativa que elegeu os impetrantes aos cargos de Prefeito e Vice- Prefeito Municipal.

No dia 05 de agosto do corrente ano, em sessão extraordinária realizada pela Câmara Municipal, foram os impetrantes, após realização de eleição indireta, escolhidos para os cargos de Prefeito e Vice-Prefeito, com maioria absoluta dos votos pelos membros. O Vereador Alexsander Oliveira, quando da posse de fato dos impetrante, fora comunicado da decisão tomada pela Casa Legislativa. Por outro lado, pelo representante do Ministério Público Estadual, fora promovida uma Ação Cautelar Inominada, tombada sob o nº 200883000569, questionando a validade da referida eleição, cuja decisão liminar determinou a suspensão de seus efeitos até provimento final, entendendo-se incluso, o ato de renúncia de ambos impetrantes aos cargos de Vereadores, por estar abrangido no procedimento eleitoral impugnado. Por fim, noticiam o intento do informante, no dia 07 de agosto, de convocar os suplentes para assumirem as vagas em aberto com a renúncia. Juntaram diversos documentos.

Os autos volveram-me conclusos para apreciação da liminar pleiteada inaudita altera pars.

Relatado. Decido.

A insurreição dos Impetrantes se cinge ao ato do Presidente da Câmara Municipal de São Cristóvão em convocar os suplentes para assumirem os cargos, cada qual, de Vereador Municipal, em virtude da nomeação daqueles, na eleição indireta realizada em sessão extraordinária na Casa Legislativa, ocorrida no último dia 05 de agosto, para os cargos de Prefeito e Vice-Prefeito Municipal.

É sabido que a exordial do Writ, como toda e qualquer petição inicial, deve obedecer ao que reza os arts. 282 e 283 do Diploma Processual Civil, sob pena de ser liminarmente indeferida.

Assim, o Impetrante pode e deve juntar à petição inaugural os documentos que entender de importância para demonstração da existência dos fatos constitutivos de seu pedido, incluindo os que são indispensáveis para a valoração imediata do Juiz do direito translúcido autorizadores da concessão da liminar pleiteada inaudita altera pars;

In casu, percebo que os Impetrantes preencheram os requisitos formais para apreciação do pleito liminar.

Desse modo, temos para a concessão da liminar pretendida, a necessidade de se verificar de plano, dois requisitos: a verossimilhança do alegado, através da aparência do direito líqüido e certo a ser tutelado e o perigo da demora.

Como verossimilhança do alegado, os impetrantes evidenciaram, além da documentação acostada, o caráter preventivo da pretensão, qual seja, preservar a existência do ato jurídico, com a não convocação dos suplentes, em virtude do sobrestamento do ato que teria gerado a vacância dos cargos de Vereadores na Casa Legislativa.

Em face da urgência da medida preventiva, evidentemente não é possível ao Julgador o exame pleno do direito material invocado pela parte interessada, até porque tal questão será analisada no julgamento do mérito quando da prolação da sentença, restando a este, apenas, uma rápida avaliação quanto a aparência de um direito líqüido e certo a ser tutelado.

A expressão de vontade tendente à renúncia foi manifestada pelos Impetrantes de forma clara, após a eleição indireta e no exato momento da posse, consoante consta do Termo de Posse.

A Ação Cautelar intentada pelo zeloso representante do Ministério Público Estadual questionou judicialmente apenas a legalidade da eleição havida na sessão extraordinária realizada de forma indireta na Câmara de Vereadores para os cargos de Prefeito e Vice Prefeito. O ponto fulcral é quanto à validade das Renúncias aos cargos de Vereador, ocorridas na sessão ? embora a Ata seja silente a respeito ? mas em ato subsequente, mas àquela vinculado.

O ato de Renúncia é tratado como irretratável, irrevogável e incondicional. Segue-se, assim, a tendência anticausalista que era abraçada pelo Código Civil de 1916, quando a ?causa? não tinha grande relevo para a consideração dos elementos. O ato adquire eficácia jurídica independentemente da causa. Exige-se apenas a presença dos pressupostos em geral: agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei.

O principal argumento dos Impetrantes é quanto ao fato das Renúncias terem sido consequentes da eleição cujos efeitos jurídicos se encontram sobrestados por decisão judicial; e quando ao defeito de forma.

Vejo, entretanto, que quatro aspectos merecem, neste instante procedimental, mesmo que perfunctórias, as devidas apreciações: a regularidade aparente ou não das eleições; os atos de renúncia imprescindíveis à investidura posterior de Prefeito e Vice-Prefeito; a manifestação livre de vontade; e a forma do ato administrativo.

A Doutrina e Jurisprudência pátrias afirmam que a eleição indireta para os cargos do executivo nos dois úlitmos anos de mandato, de responsabilidade das Casas Legislativas em todas as esferas de poder é uma Eleição Constitucional, respeitante que é do Princípio da Autonomia dos Poderes constituídos, sem a participalção da Justiça Eleitoral. Deve haver obediência ao imperativo constitucional que determina ao Poder Legislativo Municipal disciplinar o processo eleitoral para a escolha indireta dos aludidos cargos do Poder Executivo.

A Constituição Federal fez a devida previsão, submetida a regulamentação à Lei infra-constitucional, que nunca chegou a existir. Desse modo, à míngua de um diploma legislativo, deve a Casa Legislativa estabelecer regras de processamento, levando em conta os sagrados direitos individuais constitucionais.

A Eleição Indireta, redundantemente falando, é uma Eleição como outra qualquer! Mas não deveria ser ao “pé da letra” equivalente a uma votação para a composição da Mesa Diretora da Câmara, por exemplo. As disposições regimentais são apenas um ”Norte”. A sua forma de realização é sumaríssima, em 30 dias.

Infere-se dos documentos acostados que a sessão impugnada teve a Presidência do Primeiro Secretário da Casa, Vereador Israel Sarmento, que aplicou o Regimento Interno ao espelho da Eleição para a composição da Mesa Diretora. O comando procedimental foi do Presidente. Os Impetrantes, a princípio, concorreram apenas como Candidatos, assim como outros populares presentes.

O ato se apresentava legítimo. Teve ele apenas a Aparência de um ato válido? Isto é justamente o que está sendo definido em ação própria promovida pelo MPE. Caberia aos Impetrantes questionar, naquele momento, a validade do procedimento? Tal acuidade pessoal “previsibilidade objetiva” quanto à nulidade, estaria dentro das respectivas searas? Concorreram eles para a prática de ato considerado torpe, para tirar proveito indevido?

Assim como o Direito, mesmo o consolidado, se vale da Teoria da Aparência para respaldar institutos ? legítima defesa putativa, casamento putativo, filiação putativa, herdeiro aparente, credor/devedor putativo, efeito material da revelia em feitos cíveis, etc.. - não se pode postergar aquilo que, carregados de elementos convergentes à formação de um raciocínio, faz gerar uma situação que se apresenta como legal e legítima, incorrendo o sujeito em erro. Tudo isto carece de exame apurado, cujo benefício da dúvida, e por aplicação do Princípio da Boa-Fé Objetiva, presumidos sempre presentes nos atos jurídicos, neste momento, favorece os Impetrantes.

A Teoria da Aparência se apresenta quando os atos são realizados por una persona engañada por una situación jurídica que es contraria a la realidad, pero que presenta exteriormente las características de una situación jurídica verdadera, pois, quien ha dado lugar a la situación engañosa, aunque haya sido sin el deliberado propósito de inducir a error, no puede hacer que su derecho prevalezca por en cima del derecho de quien ha depositado su confianza en aquella apariencia - José Puig Brutau, in Estudos de derecho comparado, 1951, p. 103, apud Rizzardo, 223-224

A boa-fé é exigida e protegida quando conduz à aquisição de um direito; ela exerce função de adaptação quando os atos jurídicos se formam ou executam, e obsta ou restringe os efeitos das nulidades. A boa-fé que decorre de erro plenamente justificado pelas circunstâncias supre as nulidades, remove os defeitos, ... Error communis facit ius, ou nas palavras de Demogue: Celui qui a traité avec une personne ayant toutes apparences d?avoir un droit ne doit pas être trompé, l?apparence raisonnable du droit, dans les rapports avec les tiers, produit les mêmes effets que le droit lui-même .

Procura-se fazer reinar a justiça, impondo-se a existência de certo grau de credibilidade aos atos, para tornar possível a vida social dentro de um padrão médio de honestidade e moralidade.

O Erro ainda é hoje bastante questionável na doutrina, embora seja o mais frequente e o mais fácil de rezlizar-se, devido a insuficiência mental da grande maioria dos homens (CUNHA GONÇALVES, in Tratado de Direito Civil, 4/294). ?O agente é levado a pratica o ato jurídico, que não praticaria por certo, ou que praticaria em circunstâncias diversas, se estivesse devidamente esclarecido.? (BARROS MONTEIRO, in Curso de Direito Civil, 1/185).

A manifestação de vontade (renúncia), naquele momento se tratava de ato jurídico perfeito. Se o fim por eles pretendidos, o exercício no cargo de Prefeito e Vice-Prefeito, encontra-se agora sob o crivo judicial para apreciação da legalidade, inclusive com decisão determinando o sobrestamento dos efeitos da eleição indireta realizada pela Câmara de Vereadores de São Cristóvão, em 05 de agosto de 2008, o ato motivador que conduziu os impetrantes à posse nos referidos cargos, que lhe é consequente, também se encontra dependente da análise de vício.

Sob a ótica do Direito Civil a doutrina dominante enquadra e reconhece esse tipo de manifestação de vontade, como ?Erro por Falsa Causa?, que é aquele caracterizado pela falsa motivação justificada na realização do negócio; e traz como conseqüência de sua verificação a anulação do ato realizado, vez que atinge a sua essência, a sua substância, em suas qualidades essenciais. Esta ?falsa causa? estaria dentro da previsibilidade objetiva do agente? Reza o artigo 138, do NCCB: ?além de essencial, o erro deve, para permitir a anulação do negócio jurídico, ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio?.

É preciso sopesar os argumentos civis ante a peremptoriedade dos elementos característicos da Renúncia: irretratabilidade, irrevogabilidade e incondicionalidade. Entendo não se poder deixar de analisar o sítio em que ocorreu o ato, carecendo de maior dilação, exigindo o presente momento uma cautela necessária.

De mais a mais, a forma dos atos é o meio pelo qual se exterioza. Para ser válida a forma deve se compatibilizar com o que expressamente dispõe a lei ou esta não trazer vedação expressa. O aspecto da forma válida tem estreita conexão com os atos administrativos. A seqüência de atos prévios há que ser observada num iter (procedimento), até mesmo em homenagem ao princípio do devido processo legal. Torna-se viciado o ato se não foi rigorosamente observado. Se a lei exige a forma escrita e solene e o ato de outro modo corre o risco até mesmo da inexistência.

A forma é uma garantia jurídica para todos, é pelo respeito à forma que se possibilita o controle do ato administrativo, quer pelos seus destinatários, que pela própria administração, que pelo Judiciário. Até mesmo o silêncio pode significar manifestação de vontade, quando a lei fixa um prazo, significando concordância ou discordância.

Consoante se registra do artigo 94, do Regimento Interno Municipal: ?A RENÚNCIA DO VEREADOR FAR-SE-Á POR OFICIO DIRIGIDO A CÂMARA, REPUTANDO-SE ABERTA À VAGA(SIC) A PARTIR DE SUA PROTOCOLIZAÇÃO.? A curtíssimo exame se depreende a necessidade da FORMA ESCRITA, e a enumeração da Autoridade legitimamente autorizada a recepcionar. O destinatário seria o Presidente, Vereador Jorge Lisboa. A questão patenteada é aquela que diz respeito ao fato do Vereador Israel Sarmento, Primeiro Secretário, mas Presidindo uma Sessão Extraordinária, poderia ter recebido aquela manifestação de vontade, no ato da posse dos impetrantes aos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito.

Consequentemente, carece de esclarecimento a convocação dos respectivos suplentes dos Impetrantes, visto que o mesmo dispositivo supra, reputa apenas como aberta a vaga a partir da protocolização do ato de renúncia. O que de fato não ocorreu.

Quanto ao perigo da demora, ressaltam a realização, na data de 12 de agosto de 2008, de sessão legislativa, donde advirão prejuízos, além da insegurança jurídica no Município.

?Periculum in mora é dado do mundo empírico, capaz de ensejar um prejuízo, o qual poderá ter, inclusive, conotação econômica, mas deverá sê-lo, antes de tudo e, sobretudo, eminentemente jurídico no sentido de ser algo atual, real e capaz de afetar o sucesso ou eficácia do processo principal, bem como o equilíbrio das partes litigantes.?(Justiça Federal -Seção Judiciária do Espírito Santo, Proc. Nº 93-0001152-9, Juiz Macário Judice Neto, j. 12.5.1993)

Quanto este requisito, verifico-o, na medida em que os impetrantes sofrerão prejuízos, caso não concedida a providencia liminar, vez que o ato de convocação dos suplentes se encontra na iminência de sua realização.

Ex positis, CONCEDO A LIMINAR, inaudita altera pars, determinando a a abstenção do ato que determinar a convocação dos suplentes para assumir o cargo, cada qual, de Vereador Municipal no lugar dos impetrantes; ou, em assim já procedido, a revogação do ato, em virtude da existência de demanda em Juízo, para apreciação da validade da sessão extraordinária que elegeu os impetrantes aos cargos de Prefeito e Vice- Prefeito Municipal..

Notifique-se a autoridade apontada como coatora para que, no prazo legal, preste as devidas Informações.

Tendo se operado a convocação dos Suplentes, providenciem os Impetrantes a formação do Litisconsórcio Necessário Passivo, visto que os efeitos da sentença os atingirão, sob pena de ineficácia.

Intime(m)-se.

São Cristóvão /Se, 12 de agosto de 2008.

Dr. Manoel Costa Neto

- Juiz de Direito-

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